Meus estudos sobre representação,
em especial, nos documentários com sua “simulação de realidade” me ensinaram
uma coisa: o olhar do diretor seleciona aquilo que é importante dentro de seu
contexto para discorrer sobre o tema do filme. Ele não precisa dizer nada, nem
de voz over[1],
mas aquilo que ele escolhe dar visibilidade contém seu pensamento e sentimentos
de maneira implícita, diz sobre o diretor, muito mais que sobre o objeto em si.
Pois bem, se o meu instagram
fosse um filme sobre minha vida, sobre o qual eu pudesse tecer uma análise de
mim mesma em terceira pessoa, eu diria: essa moça é publicitária, entende de
imagem e de cinema, mas escolheu não se representar assim. Por quê? Suas
imagens não representam o olhar de uma especialista na área. Talvez ela tenha
tentando, mas simplesmente decidiu que ali não era lugar de fazer pose, parecer
cult e legal. Andava meio cansada disso tudo.
Creio que talvez ela tenha ficado
na dúvida, achou por alguns momentos que seu olhar fosse desinteressante, quem
sabe por não parecer muito perspicaz aos olhos do mundo ou acerca do que
esperavam que ela produzisse para esta maravilhosa rede de narcisismos
incontáveis.
Assim, na obra documental de
Francielle Felipe Faria de Miranda, observamos um número sem fim de temas
recorrentes: ela e seu marido (nunca só ele ou só ela, sempre os dois), seus
sobrinhos, suas irmãs, suas amigas e amigos, suas flores, seus cafés e alguns
lances de eventos espíritas. Tem um pouco de dança e música também.
Ah, essa moça não sabia, nunca
tinha parado para perceber o quanto de doçura há em seu coração. O andar dela é
altivo, sempre bem arrumada (dizem que ela tem estilo), fala com uma braveza,
expõe suas opiniões com tanta ênfase e certeza, é crítica, ágil, parece tão
forte, mas o "filme" mostra outra faceta desta mesma vida: um mundo de feminices,
fofurices, sentimentos doces e nobres, poesia.
A diretora não tem costume de
falar sobre os temas que aparecem neste produto cultural da forma como ela os coloca ali,
foi uma construção quase inconsciente, mas eles estão lá na sua obra. A “voz do
documentário”[2] é
representação de si mesma, em tons quentes, aveludados, com textura de sonho.
Coisas que vêm lá do coração e que ela parece nunca ter enxergado sobre si
mesma.
Menina boba essa diretora.
Menosprezou seu filme, achou que ele era insosso, quando na verdade é
uma dessas obras que fazem a gente pensar: existem outras coisas que precisam
ser enaltecidas nesta vida. Família, casamento, união, amizades, pausas
revigorantes, longas conversas, boas risadas e um sentimento de reverência para
o Deus que criou e possibilitou isso tudo.
Talvez nunca tenha tido a chance
de olhar para si através de outro prisma, mas agora que olhou, descobriu que é
muito mais do que imagina. Leu as críticas, demorou a acreditar no que diziam
sobre seu filme, sobre o seu olhar, mas concluiu: eles estão certos.
[1] Ocorre quando ouvimos a voz do diretor a fazer algumas
considerações no filme documentário, como um narrador.
[2] Conceito cunhado por (NICHOLS, 1997) na publicação Introdução
ao documentário, da editora Papirus.
A voz do documentário transmite qual é o ponto de vista social do
cineasta e como se manifesta esse ponto de vista no ato de criar o filme. Fala
através de todos os meios disponíveis para o criador, em especial, seleção e
arranjo de som e imagem que conduzem a lógica organizadora do filme.
A voz aparece como um dos elementos de análise da representação nos
documentários, que inclui ainda outros elementos tais como os aspectos sonoros,
imagéticos, estilísticos e lingüísticos.